Se tinha um festival que eu SEMPRE pensei estar, que eu sempre babava no line-up (sempre pequeno…) e que eu lia as resenhas e chegava a desacreditar, este era o Primavera Sound. Desejo / sonho / obrigação moral cumpridas (lógico que preciso voltar para viver os 4 dias do festival) no dia de ontem e ainda parece vivo na memória (muito em conta por quase não dormir e estar no aeroporto agora para pegar um voo para Lisboa).
Enfim, eu sempre lia que o Primavera era grande. Grande na estrutura, grande no line up, grande em seu nome e grande em seu espaço, mas sinceramente que eu não pensava no gigantesco local. Falar que o Primavera é grande, é um insulto. Ele não tem fim, sem brincadeiras. Eu, com apenas um dia de festival, vi 6 palcos, mas são oito. Teve dois que eu não tive condições / tempo de ver. Absurdo ou não? Além disso, dá até um aperto no coração pensar que chamamos algumas coisas no Brasil de festival. De verdade… Triste. Mas vamos ao relato escrito mentalmente e corrigido agora.
17h desço do metrô (150 metros do festival), mesmo horário que o Beach Beach começa no palco Pitchfork… Não corro por saber que o negócio será tenso, passada na bilheteria e 17h10 estou dentro, com o staff do festival perguntando se eu preciso de ajuda (acho que a cara de perdido no mapa ajudou) ou de algo. Dou um sorriso de obrigado e parto para a primeira cerveja (500 ml / 4,50 EUR, mais barata que alguns restaurantes! APRENDE BRASIL!) e com os primeiros goles, me acho na direção e chego para ver a última música do Beach Beach. 35 minutos de show?! Ah eles vão fazer uma ‘outra metade’ em outro palco em 40 minutos, é o que me responde um espanhol ao ouvir meu "Já?!". Amizades, bom dia!
Parto para uma barulheira estranha e gostosa no palco ao lado (Vice), mas não consigo me prender muito. A cerveja acabou e eu resolvo esperar (leia-se esconder do sol escaldante de 17h40) no palco ao lado e ver o que o Milk Music tem para mostrar. A cara deles parece de adolescentes feios que querem ter uma banda para conquistar mulher. A música é bacana, mais uma cerveja e me vejo até curtindo um pouco. Penso no Beach Beach tocando no outro palco, mas o Milk Music me faz ainda curtir mais um pouco… Acaba a cerveja e um sinal divino me faz ir até o palco ver o Beach Beach, chego 18h35 e ouço a última música, DE NOVO! Ou seja, não era para ver mesmo.
18h40 eu me sento em uma das arquibancadas em frente ao palco Ray Ban que, em 10 minutos, o The Chameleons tocará. Depois de 1 litro de cerveja na cabeça / corpo, em 1h40, eu resolvo ir ao banheiro e me reabastecer. Volto em 8 minutos (banheiros vazios e bar vazio, por conta do horário) e pego meu lugar no meio de uma galera antiga pela idade média. Eu conhecia 2 músicas do Chameleons, mas digo que preciso baixar mais coisas deles. Show bom, coeso, forte (sol de 19h castiga! De verdade) e que fica mais poderoso por conta da iteração do vocalista com o público que responde fazendo os primeiros pulos que vi do dia. Quase 1 hora depois o Chameleons informa "Mais uma música só, que eu preciso urinar" e eu também. Me despeço com uma dor no peito, mas ciente que presenciei algo poderoso.
Dou uma passada no palco Pitchfork novamente onde uma dupla faz um barulho estranho e bisonho que não me prendeu em mais de 2 minutos e parto para o Vice que uma galera aplaude com sorrisos no rosto de incredulidade (estranho?!) e descubro Orthodox. Pela foto você entende o que é tão incrédulo. A banda mostra algo de hardcore, de heavy metal, de grind e em alguns momentos me lembra Soziedad Alkoholika, outros me lembra algo com uma aura de Pantera. Com certeza uma agradável surpresa. Umas 5 músicas depois (barulho muito mais que letras), parto para uma peregrinação, visto que eu teria que ir até o Mini o palco no extremo oposto de onde eu estava. Camelando no sol de quase 20h, a pino, na 4a cerveja do dia (que o corpo já mostra sinais de rejeição, afinal são 2 litros) e depois de uma bela caminhada (com uma passagem retardada de bonita) chego ao palco Mini onde o Girls entra. Tinham me falado bem do Girls e que seria uma surpresa agradável, mas não me bateu. Pareceu uma banda ruim de formatura, daquelas que você prefere dar um passeio a curtir. Não parece algo muito animador e nem que vá melhorar em 2 ou 3 músicas. Começo a pensar em comer algo e parto para um hambúrguer (Um x-Bacon gigante, por EUR6,50!) para acalmar o estômago (ironia, bom dia!) e ao andar ouço um som bacana vindo do palco “Adidas Originals” e nele uma banda tocando para 10 pessoas, mas ainda assim poderosa que me faz até lembrar de Autopilot Off e em certos pontos de Metropol. Ao olhar a programação do festival descubro se tratar de Foam Lake, uma banda do Canadá e me prendo ali para umas 7 músicas dos caras que não tocavam para ninguém, mas ainda assim mostraram uma qualidade bacana e que arrancou aplausos e comentários do tipo "Very nice band" de uns ingleses que estavam ao meu lado. Vale a conferida.
Ao olhar para trás vejo uma legião (pique manada) vindo (provavelmente tinha terminado o famoso Girls) e eu pensei nessa galera toda pegando lugar no The Cure e me ponho a tentar sair na frente deles (totalmente desnecessário, visto que o palco principal já estava bem cheio e o palco sendo preparado para o Cure). Outra ida ao banheiro, um redbull (afinal o estômago tem que se foder mesmo!) para manter a energia que resta e sento para dar uma descansada. 21h30 e aquele lugar parece um inferno por conta de cigarro / maconha / línguas diferentes / cansaço / costas já falando comigo. Vai enchendo mais e 22h11 (EXATAMENTE) o Cure toma conta do palco.
Abertura com PlainSong e me segue com Pictures of You e daí desencana de costas doer, do cansaço doentio, das horas em pé, de ir para lá e para cá. The Cure é a cura (trocadilho imbecil, mas necessário) para qualquer ser humano. Ao meu lado uma espanhola com o marido se beijam e falam "Obrigado por isso" juntos, apaixonante. Vai sendo desenhada uma noite memorável e o setlist passeia por tudo que o Bestival 2011 te mostra e pitadas de Wish (acho que umas 2 ou 3 músicas ficaram de fora, inclusive A Letter to Elise, MERDA!), mas uma banda que tem tantos hits e tantos hinos, não consegue se manter por baixo. Se eles tocam uma música estranha para você, o do lado a considera a melhora e vice-versa. Não tocaram A Letter To Elise, que estava em meu TOP 5, mas eles me mandaram, de presente inusitado, Mint Car (em uma versão que pareceu meio atrapalhada, mas mágica) e Wrong Number. Duas que considero perfeições escritas pelo Robert e que há tempos não eram tocadas (inclusive no Bestival não tem nenhuma delas). Três horas de The Cure é para qualquer ser humano pedir clemência, ajoelhar no lixo e agradecer pela oportunidade única. Três horas. TRÊS HORAS!
Pontos altos desse show tiveram vários. O início com Plainsong, Pictures of You, High e The End of the World. O final suicida com Wrong Number, One Hundred Years e Disintegration. Ouça essas músicas e entenda a atmosfera criada. Aí ele simplesmente fala um "Bye Barcelona" e vaza. O casal ao meu lado vira e fala "Ele não pode terminar assim. Amor?" e eu concordei. É muita informação. Depois da volta ele não ajudou em nada tocando The Kiss com uma versão doentia e barulhenta demais para se respirar e outras mais… Mas no segundo bis, ele ganhou o público e deu um beijo de boa noite na testa de cada um. Foi hit atrás de hit. Nessa hora minhas costas travaram e fiquei de longe vendo o show e para minha surpresa, a galera de trás estava curtindo totalmente o show, dançando e se divertindo como eu jamais poderia imaginar. Dali até o final com Boys Don’t Cry, ele se despedindo com a cara maior de timidez que vi na vida e a galera sorrindo, mas ao mesmo tempo querendo entender o que aconteceu, é página ainda indecifrável para mim. Preciso de alguns dias para digerir tudo isso e escrever com calma.
Por hoje, este relato monstro do Primavera Sound está bom.
Estou agora em Portugal e as coisas daqui eu conto amanhã, antes do Rock in Rio!
Já conseguiu digerir a cura?!?
Pior que não… Mas fico cantarolando Pictures of You e Disintegration os dias diretos… impressionante!